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Meio Jurídico

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) reformou sentença e condenou na segunda instância judicial a produtora de defensivos agrícolas Ihara (Iharabras S.A Indústrias Químicas), de Sorocaba, pela prática de assédio eleitoral. A empresa deverá cumprir uma série de obrigações e pagar uma indenização de R$ 1 milhão por danos morais coletivos. A ação é do Ministério Público do Trabalho (MPT).

A Ihara foi denunciada ao MPT durante a campanha eleitoral de 2022, por supostamente estar coagindo trabalhadores a votar no então candidato à reeleição para o cargo de presidente da República, Jair Bolsonaro.

A denúncia relatava que os gestores reuniram seus empregados em um evento corporativo, no mês de setembro de 2022, no pátio da empresa, obrigando-os a vestirem camiseta verde e amarela. Na ocasião, foram proferidos discursos pró-Bolsonaro, com o intuito de induzir e coagir o voto dos trabalhadores, o que caracteriza a prática de assédio eleitoral.

O procurador Gustavo Rizzo Ricardo, oficiante no inquérito, enviou à empresa uma notificação recomendando uma série de medidas a fim de impedir a ocorrência do ilícito, incluindo o compromisso da Ihara em não interferir no direito de escolha dos empregados.

Em manifestação nos autos, a empresa negou que tivesse promovido ato em caráter eleitoreiro. Justificou que, no mês de setembro, em razão da comemoração do bicentenário da independência, e a propósito da Copa do Mundo de futebol, realizou um “ato cívico”, que contou com a presença da Banda da Polícia Militar do Estado de São Paulo para a execução do hino nacional. Na ocasião, segundo a empresa, os empregados foram convidados via correio eletrônico e receberam as camisetas da seleção brasileira para usarem no dia do ato, mas “sem caráter vinculante ou obrigatório”, de forma que não seria possível cumprir a notificação do MPT.

Em depoimentos prestados por ex-empregados demitidos desde setembro de 2022, ficou constatado que, de fato, houve coação da empresa na tentativa de influenciar o voto dos funcionários em favor do candidato Jair Bolsonaro.

Foi proposta a assinatura de TAC (termo de ajuste de conduta), que foi recusada pela empresa. Sem alternativas, o procurador ingressou com ação civil pública.

“A Constituição Federal e a legislação trabalhista e eleitoral asseguram expressamente a liberdade de consciência e de orientação política por parte dos empregados. Portanto, o empregador deve assegurar tratamento justo e imparcial aos trabalhadores, impedindo qualquer forma de discriminação por opinião política”, atesta Rizzo Ricardo.

Decisão 

O acórdão altera a sentença de primeira instância, proferida em junho de 2024 pela 3ª Vara do Trabalho de Sorocaba, que julgou improcedentes os pedidos do MPT.

Segundo o juiz relator, Maurício de Almeida, “o contexto dos atos promovidos pela ré, naquele momento político, não pode ser interpretado meramente como um ato cívico, desvinculado de qualquer conotação partidária. Ao contrário, as ações impostas aos trabalhadores demonstram um alinhamento explícito da empresa com o apoio a um determinado candidato. Tais práticas extrapolaram os limites de um suposto ato cívico que, aliás[...], nunca havia acontecido na empresa, transformando-se em um claro direcionamento político por parte da reclamada”.

Dentre as obrigações impostas à ré estão: não promover atos políticos ou usar imagens ou símbolos com referências político-partidárias; não adotar condutas que, por meio de assédio moral, discriminação, violação da intimidade ou abuso de poder, tentem coagir, intimidar, advertir ou influenciar o voto dos empregados nas eleições; não obrigar, exigir, impor, induzir ou pressionar trabalhadores a realizar qualquer atividade ou manifestação política a favor ou contra qualquer candidato ou partido político; não permitir ou tolerar que terceiros nas instalações pratiquem as condutas de assédio eleitoral.

Por fim, a empresa deve divulgar um comunicado garantindo que os empregados têm o direito de escolher livremente seus candidatos nas eleições sem sofrer retaliações, em diversos meios (e-mail, redes sociais, site, etc), além de pagar indenização por danos morais coletivos de R$ 1 milhão.

Caso descumpra a decisão, será imposta multa de R$ 200 mil por infração, reversível ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).

“O MPT intensificará sua atuação repressiva durante o processo eleitoral de 2026, com a finalidade de garantir a liberdade de pensamento da classe trabalhadora dentro das empresas, impedindo, assim, que o direito de opinião política, garantido pela Constituição Federal, seja assegurado”, finalizou o procurador.

Assédio eleitoral - O assédio eleitoral ocorre sempre que há uma intimidação do empregador, utilizando de sua estrutura empresarial e de seu poder diretivo, para modificar o voto do trabalhador a ele vinculado.

São exemplos de assédio eleitoral: ameaça de demissões a depender do resultado das eleições; obrigar a utilização de uniformes alusivos a determinado candidato; incentivos financeiros ou promessas de promoção condicionados à vitória de determinado candidato; reuniões internas com o objetivo de mobilizar o voto dos trabalhadores; proibir a locomoção do empregado no dia da eleição, impedindo-o de votar.

Além de representar uma grave infração trabalhista, o assédio eleitoral é crime, previsto no Código Eleitoral brasileiro (Lei 4.737/1965). O artigo 301 prevê que "é crime usar de violência ou grave ameaça para coagir alguém a votar ou não votar em determinado candidato ou partido, ainda que os fins visados não sejam conseguidos".

Números

Em 2024, o MPT registrou 965 denúncias sobre o tema em todo o país. Desse total, 420 denúncias estavam relacionadas a assédio eleitoral envolvendo a Administração Pública.

Em 2022, as irregularidades apontadas ao MPT ocorreram majoritariamente entre o primeiro e o segundo turno das eleições presidenciais. Apenas no interior de São Paulo, a atuação ministerial resultou em 38 termos de ajustes de conduta (TACs), 8 ações judiciais e 104 notificações recomendatórias.

Processo nº 0012621-48.2023.5.15.0109. (MPT)

Empresa se posiciona 

Em resposta à matéria, que foi divulgada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a Ihara (Iharabras S.A Indústrias Químicas) encaminhou nota à imprensa, destacando que a decisão não é definitiva e que o processo judicial ainda está em tramitação.

A Ihara expressou confiança de que o Poder Judiciário irá reverter a decisão, frisando que nenhuma infração foi cometida. A empresa reforça que o evento em questão foi um ato cívico tradicional para celebrar a Independência do Brasil, uma prática que ocorre há anos em suas instalações.

A Ihara fez questão de salientar que a participação dos colaboradores é totalmente espontânea e voluntária, sem qualquer tipo de obrigatoriedade. 

Confira a nota da empresa na íntegra:

Nota à imprensa

A Ihara (Iharabras S.A Indústrias Químicas), localizada em Sorocaba/SP, em resposta a matéria divulgada no dia 28 de agosto, pelo Ministério Público do Trabalho, informa que a decisão judicial em segunda instância, por suposta prática de assédio eleitoral, não é definitiva. O processo segue em fase de tramitação, e acreditamos que o poder judiciário concluirá que nenhuma infração ocorreu.

A empresa reitera sua segurança em relação ao ato cívico promovido em alusão à Independência do Brasil, tradição que ocorre há anos na Ihara. O evento contou com a participação da banda sinfônica da Polícia Militar de Sorocaba, que já havia sido convidada em anos anteriores para essa comemoração. 

A Ihara reforça, ainda, que a participação dos colaboradores é espontânea, sem caráter obrigatório, e que em nenhum momento houve indução ou coação de voto. A empresa respeita a liberdade e o direito democrático de escolha de cada colaborador. (Matéria atualizada às 17h11min)